sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Descalça vai para a fonte
Leonor, pela verdura;
vai formosa e não segura.

Leva na cabeça o pote,
o testo nas mãos de prata,
cinta de fina escarlata,
sainho de chamalote;
traz a vasquinha de cote,
mais branca que a neve pura;
vai formosa e não segura.
Descobre a touca a garganta,
cabelos de ouro o trançado,
fita de cor de encarnado…
tão linda que o mundo espanta!
chove nela graça tanta
que dá graça à formosura;
vai formosa, e não segura.

Luís de Camões
1524 // 1580 ( século XVI)


https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEggm32xNEulhIzoe2LCn-qurEJ1E4aWQk_lke3d5q4UDDsCcMOTNys9ckHUWATLLD1sa0L0NWJtbJRIyW0j6pXlZagfhKCDGwdQIRKjapY0GJ6-bOBouUUzEYdE-Ceyby7eUQFKJNT8mpU/s1600/7-CAM%C3%95ES+++FOTO+COM+NOME.jpg




POEMA DA AUTO-ESTRADA
Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta
Vai na brasa de lambreta.

Leva calções de pirata,
Vermelho de alizarina
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.


Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa de lambreta.


Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.


Como rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.
Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.


Fuge, fuge, Leonoreta
Vai na brasa de lambreta.


António Gedeão
1906 // 1997 ( século XX)

In Máquina de Fogo

https://encrypted-tbn2.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcQzPUJeOslL66AW9UtjFvxzOn8ZSN9pR1BQ71QS49IZV7B2thenrQ

Sem comentários:

Enviar um comentário