AULAS DE POESIA E CONTO DA UNIVERSIDADE SÉNIOR DE SOUSEL PROFESSORA ZUZU BALEIRO http://poesiaecontosousel.blogspot.pt/
sexta-feira, 23 de janeiro de 2015
“UMA CONVERSA POR MÊS”
“UMA CONVERSA POR MÊS” NEM SABE O BEM QUE LHE VAI FAZER
Aqui são debatidos temas pertinentes, oportunos e motivadores fazendo com que as pessoas saiam de casa e num momento descontraído deixem os problemas de lado.
A primeira conversa ocorreu no dia 25 de Novembro pelas 15h30, no auditório da Biblioteca Municipal de Sousel onde os presentes aderiram e participaram ativamente nesta conversa.
Um projeto da Rede Social e da Universidade Sénior que contam com o apoio da professoras Zulmira Baleiro e Joana Emília reis, pretende assim contribuir para um estilo de vida mais saudável e motivador nesta etapa das suas vidas, promover encontros e conversas em que se reforce a solidariedade inter/intra geracional, criar situações de aprendizagem e informação sobre cidadania, saúde, bem-estar e lazer.
Conversas que vão proporcionar aos participantes momentos de entretenimento, cultura e interação entre todos, podendo assim, ocupar os seus tempos livres e alargar horizontes.
A primeira conversa ocorreu no dia 25 de Novembro pelas 15h30, no auditório da Biblioteca Municipal de Sousel onde os presentes aderiram e participaram ativamente nesta conversa.
Um projeto da Rede Social e da Universidade Sénior que contam com o apoio da professoras Zulmira Baleiro e Joana Emília reis, pretende assim contribuir para um estilo de vida mais saudável e motivador nesta etapa das suas vidas, promover encontros e conversas em que se reforce a solidariedade inter/intra geracional, criar situações de aprendizagem e informação sobre cidadania, saúde, bem-estar e lazer.
Conversas que vão proporcionar aos participantes momentos de entretenimento, cultura e interação entre todos, podendo assim, ocupar os seus tempos livres e alargar horizontes.
REDES SOCIAIS
AMOR É UM FOGO QUE ARDE SEM SE VER
Amor é um
fogo que arde sem se ver,
É ferida que dói, e não se sente;
É ferida que dói, e não se sente;
É um
contentamento descontente,
É dor que desatina sem doer.
É dor que desatina sem doer.
É um não querer mais que bem querer;
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.
É um andar solitário entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É um cuidar que ganha em se perder.
É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata, lealdade.
Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?
DE TARDE
Naquele
«pic-nic» de burguesas,
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampamos, inda o Sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão-de-ló molhado em malvasia
Mas, todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!
Houve uma coisa simplesmente bela,
E que, sem ter história nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarela.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão-de-bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima duns penhascos,
Nós acampamos, inda o Sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão-de-ló molhado em malvasia
Mas, todo púrpuro a sair da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!
Cesário Verde
BARCA BELA
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BALADA DE NEVE
Batem leve, levemente, como quem chama por mim.
Será chuva? Será gente?
Gente não é, certamente
e a chuva não bate assim.
É talvez a ventania:
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...
mas há pouco, há poucochinho,
nem uma agulha bulia
na quieta melancolia
dos pinheiros do caminho...
Quem bate, assim, levemente,
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.
com tão estranha leveza,
que mal se ouve, mal se sente?
Não é chuva, nem é gente,
nem é vento com certeza.
Fui ver. A neve caía
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!
do azul cinzento do céu,
branca e leve, branca e fria...
Há quanto tempo a não via!
E que saudades, Deus meu!
Olho-a através da vidraça.
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...
Pôs tudo da cor do linho.
Passa gente e, quando passa,
os passos imprime e traça
na brancura do caminho...
Fico olhando esses sinais
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...
da pobre gente que avança,
e noto, por entre os mais,
os traços miniaturais
duns pezitos de criança...
E descalcinhos, doridos...
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!
a neve deixa inda vê-los,
primeiro, bem definidos,
depois, em sulcos compridos,
porque não podia erguê-los!
Que quem já é pecador
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...
sofra tormentos, enfim!
Mas as crianças, Senhor,
porque lhes dais tanta dor?!...
Porque padecem assim?!...
E uma infinita tristeza,
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.
uma funda turbação
entra em mim, fica em mim presa.
Cai neve na Natureza
e cai no meu coração.
Augusto Gil
A FONTE DAS TRÊS COMADRES
Era uma vez um rei muito poderoso que teve uma enfermidade
nos olhos e ficou completamente cego. Consultou então os melhores médicos do
mundo, tomou todos os remédios aconselhados pela ciência, mas nada conseguiu. A
sua cegueira parecia incurável. Um belo dia, apareceu, no palácio, uma velhinha
a pedir esmola e, sabendo que o rei estava cego, pediu licença para lhe dirigir
a palavra, pois desejava ensinar-lhe um remédio maravilhoso.
Conduzida à presença do
rei, ela disse-lhe:
— Saiba Vossa Majestade que só existe uma coisa capaz de fazer voltar a sua
vista: é banhar os seus olhos com água tirada da Fonte das Três Comadres. É
muito difícil, porém, ir a essa fonte que fica num reino situado quase no fim do mundo. Quem for buscar a água deve entender-se com uma mulher que
mora perto da fonte. Ela conhece o dragão que guarda a fonte e sabe quando ele
está acordado ou adormecido.
O rei ficou muito
satisfeito com a informação da velhinha e recompensou-a com uma bolsa cheia de
dinheiro.
Mandou, em seguida,
preparar uma esquadra de vários barcos para conduzir o seu filho mais velho que
deveria ir buscar a água da fonte milagrosa.
Deu-lhe o prazo de um ano para cumprir a sua missão, aconselhando-o a não parar
em nenhum porto para não se distrair do que devia fazer. O príncipe partiu, mas
no meio da viagem, encontrou uma cidade onde havia muitas festas e lindas
moças. Atraído pelos divertimentos, aí ficou a gastar todo o dinheiro que
levava e contraindo grandes dívidas. No fim do prazo que lhe fora marcado, não
seguiu viagem nem voltou ao reino do seu pai, o que causou a este um profundo
desgosto.
Resolveu então o rei
preparar outra esquadra de vários barcos a fim de que o seu segundo filho fosse
buscar a água maravilhosa. O moço partiu, mas encontrou no seu caminho a mesma
cidade onde se havia arruinado o seu irmão mais velho. Ficou também encantado
pelas festas e pelas moças bonitas, e gastou tudo o que trazia, esquecendo-se
da missão que o seu pai lhe confiara. No fim de um ano, ainda se encontrava
nessa cidade, pobre e endividado.
O rei, ao saber da
notícia do que acontecera ao seu segundo filho, ficou muito triste e
desanimado. E perdeu a esperança de curar a sua cegueira. Mas o seu filho mais novo,
que era ainda um menino, não se conformou com os acontecimentos e disse-lhe:
— Agora, meu pai, eu é que vou buscar a água. Garanto-lhe que hei-de
trazê-la!
O rei procurou
dissuadi-lo: — Se os teus irmãos, que
eram homens nada conseguiram, que poderás tu fazer, meu filho?
Mas, o pequeno príncipe
tanto insistiu e rogou, que o pai acabou por ceder. E mandou preparar uma
esquadra para a sua viagem. O jovem partiu cheio de esperança. Depois de muito
navegar, encontrou a famosa cidade onde os seus irmãos já se achavam presos
pelas dívidas que haviam contraído. O príncipe pagou as dívidas dos irmãos e
conseguiu pô-los em liberdade. Estes tudo fizeram para dissuadir o rapaz de
seguir viagem. Mas o príncipe nada quis ouvir e continuou, resolutamente, a sua
jornada.
Ao chegar à região onde
se encontrava a Fonte das Três Comadres, desembarcou sozinho, levando apenas
uma garrafa. Seguiu logo para a casa da velhinha, que residia perto da fonte.
Esta ao vê-lo ficou
muito admirada, dizendo: — Por que vieste
aqui, meu netinho? Estás a correr um grande perigo! O monstro que vigia a fonte
é uma princesa encantada que tudo devora. Se quiseres, realmente, apanhar água
da fonte, aproveita a ocasião em que o monstro estiver adormecido. Quando ele
estiver com os olhos abertos, podes aproximar-te sem receio. É sinal de que
está a dormir. Mas se o encontrares com os olhos fechados, foge depressa, pois ele
estará, de certeza, acordado.
O príncipe prestou
bastante atenção aos conselhos da velha e seguiu para a fonte. Quando lá
chegou, viu que a fera estava com os olhos abertos. Verificando que ela estava
a dormir, o príncipe aproveitou o momento para encher a sua garrafa com a água
milagrosa. Mas, quando se ia a retirar cuidadosamente, o monstro acordou e lançou-se,
com fúria, sobre o rapaz. Este puxou da espada e travou uma luta terrível com a
fera. Depois de muito lutar, conseguiu ferir o horrendo bicho e fazer o seu
sangue correr. Nesse momento, o monstro desencantou-se, transformando-se numa
belíssima princesa. O príncipe ficou extasiado, pois nunca tinha visto uma moça
tão formosa.
Ela então disse-lhe: — Prometi que havia de me casar com aquele que
me desencantasse. Portanto, dentro de um ano, virás buscar-me. Se não o
fizeres, irei à tua procura.
E para que ela pudesse reconhecer
o jovem príncipe, quando fosse buscá-la, a princesa deu-lhe um pedaço do seu
vestido.
Contente e feliz, o príncipe partiu de
volta à sua terra. Ao passar pela cidade onde se encontravam os seus irmãos,
convidou-os para embarcar na sua esquadra, a fim de que pudessem regressar ao
seu país. Os irmãos aceitaram o convite. O rapaz havia guardado a garrafa com a
água milagrosa dentro de uma mala. Os seus irmãos armaram, então, um plano para
lhe roubarem a garrafa e se apresentarem ao pai como seus salvadores. Para isso
sugeriram, ao príncipe, dar um banquete no barco para comemorar o facto de ele ter
conseguido o maravilhoso remédio. Durante a festa , os irmãos, aproveitando-se
da boa fé do jovem príncipe, conseguiram que ele bebesse muito vinho e adormecesse
profundamente. Tiraram-lhe do bolso a chave da mala, abriram-na, tiraram a
garrafa com o remédio e substituíram-na por outra garrafa cheia de água do mar.
Quando a esquadra
atracou no porto da sua terra, o príncipe foi recebido com grande alegria e
muitas festas. Mas, quando ele colocou nos olhos do pai a água que supunha ser
da fonte maravilhosa, o velho soltou um grito de dor, devido ao sal do mar, e
continuou cego. Os dois irmãos traidores acusaram então o príncipe de impostor
e declararam que eles é que tinham ido buscar a água milagrosa. Dizendo isso,
banharam com a mesma os olhos do rei que recobrou a visão.
Houve então grandes
festas e banquetes no palácio e o jovem príncipe foi condenado à morte. Mas os
soldados encarregados de degolarem o príncipe, ficaram com pena do rapaz e deixaram-no na floresta. O príncipe ficou tão
desgostoso que perdeu o amor à vida. Um lenhador malvado encontrou-o,
caminhando como um louco, no meio da mata. Vendo que ele não reagia, fez dele
seu escravo, obrigando-o a trabalhar, sem descanso.
Um ano depois, chegou a
ocasião em que o rapaz devia ir casar com a princesa, conforme havia combinado
na Fonte das Três Comadres. Como ele não aparecesse, a princesa ficou
preocupada. Mandou então aparelhar uma poderosa esquadra e partiu para o reino
do príncipe. Chegando lá, deu ordem ao comandante da esquadra para avisar o rei
de que ele devia enviar-lhe o filho que fora ao seu reino buscar um remédio e
lhe prometera casamento. Caso o noivo não viesse ao seu encontro, ela ordenaria
à esquadra para fazer fogo sobre a cidade. O rei ficou apavorado e mandou o seu
filho mais velho apresentar-se à princesa, supondo que ele fosse o noivo.
Mas a princesa, ao vê-lo
disse: — Grande mentiroso, onde está o
sinal do nosso reconhecimento?
Ele, que nada possuía,
ficou calado e voltou para terra envergonhado.
Nova intimação e foi ter
com a princesa o segundo filho do rei. Repetiu-se a pergunta anterior e o
príncipe nada respondeu. A princesa mandou então que os canhões da sua esquadra
fossem preparados para bombardear a cidade. O rei ficou aflitíssimo, com a certeza
de que a capital do seu reino seria arrasada, pois havia mandado matar o filho
mais moço. Nesse momento, surgiram os dois soldados encarregados de executar o
jovem príncipe, que confessaram ao rei que não o tinham degolado. Saiu toda a
gente à procura do príncipe e foi prometido um grande prémio a quem o
encontrasse.
O lenhador que o tinha
escravizado ficou muito assustado quando soube que ele era filho do rei. Mais
do que depressa, colocou o rapaz, que estava muito magrinho e enfezado, às
costas e levou-o ao palácio. O príncipe foi então lavado e vestido com lindas
roupas. O prazo que a princesa tinha concedido já estava a terminar e, quando
os canhões iam começar a bombardear a cidade, o rapaz correu ao encontro da princesa,
sendo logo reconhecido por esta, devido ao pedaço do vestido que levava na mão.
A princesa abraçou-o chorando de alegria. Seguiram então para o reino da
princesa onde se casaram no meio de festas que duraram seis meses. O rapaz
tornou-se rei de um dos países mais belos e ricos do mundo. Os seus irmãos traidores
foram expulsos do reino do seu pai e condenados a pedir esmola até ao fim da
sua vida.
FIM
sexta-feira, 16 de janeiro de 2015
MARIA DA SILVA
Era uma vez um rei, que andava à caça, e perdeu-se no monte, quando se fechou a noite. Foi com o seu pajem pedir agasalho a uma cabaninha de um carvoeiro que vivia na serra. O carvoeiro deu logo a sua cama ao rei, e a mulher, como estava doente, ficou deitada numa enxerga na cocheira.
De noite ouviu o rei um grande alarido, e choros, e uma voz que dizia:
– Esta, que agora acaba de nascer
Ainda há de ser tua mulher;
E por mais que a sorte lhe seja mesquinha
Sempre contigo virá a ser rainha.
O rei ficou bastante atrapalhado, e tratou de saber que horas eram. Era meia-noite em ponto. Ao outro dia quando falou com o carvoeiro, perguntou-lhe que barulho tinha sido aquele.
– Foi uma filhinha que me nasceu; havia de ser pela meia-noite em ponto, senhor.
O rei disse que queria fazer a fortuna daquela criança, e que lhe daria muito dinheiro se a deixasse ir com ele. O carvoeiro concordou e o rei partiu com a menina.
Pelo caminho disse ao pajem que fosse matar aquela criança, porque era preciso fugir a um agouro com que ela tinha nascido. O pajem não teve alma para matar a inocente, e deixou a criança no fundo de um barranco, entre uns silvados, embrulhada numa capa vermelha que ele usava.
Tornou para onde estava o rei, e disse: – Real senhor, não tive ânimo de matar a criança, mas deixei-a num sítio donde se não vê nem monte nem fonte, e lá morrerá com certeza.
Aconteceu que um rachador de lenha veio trabalhar para aquele sítio, ouviu chorar uma criança, desceu ao barranco e condoído, tirou-a e levou-a para casa. A mulher, que não tinha filhos, acolheu-a com satisfação e tratou-a como se fosse do seu sangue, e chamavam-lhe Maria da Silva, em lembrança do acontecido.
Passados anos, o pajem ia com o rei de jornada e viu uma rapariguinha de cinco anos vestida com uma capotinha vermelha, que ele conheceu ser feita da sua capa. Foram ter com os camponeses, souberam a história da rapariga, o rei deu-lhes muito dinheiro, para o deixarem levá-la para o palácio; assim que o rei chegou ao palácio, mandou fazer um caixão onde meteu a Maria da Silva, e foi ele mesmo deitá-la ao mar. Um navio encontrou no alto mar o caixão, quiseram ver o que continha, e ficaram pasmados por acharem ainda viva uma criança muito linda. Foram contar tudo à terra a que chegaram, e o rei dali quis ver a rapariguinha, a rainha tomou-lhe amor, e quis que ela se criasse no palácio, para servir de aia à princesa. Quando se fizeram as festas do casamento da princesa, já Maria da Silva era grande; vieram às festas do casamento muitos reis e príncipes e veio também aquele que queria matar Maria da Silva.
O pajem que o acompanhava conheceu logo Maria da Silva, e disse-o ao rei, seu amo. O rei, quando foi ao serão, quis dançar com ela, que estava muito bem vestida e muito bonita, e deu-lhe um anel dizendo:
– Dançando to dou, dançando mo hás de dar;
E se mo não deres, a vida te há de custar.
E ela respondeu-lhe:
– Dançando o recebi, dançando o hei de dar;
Também hei de ser rainha e no seu reino reinar.
Acabado o serão, Maria da Silva foi para o seu quarto, e uma criada comprada pelo tal rei, roubou-lhe o anel e deitou-o ao mar. Maria da Silva ficou muito triste, quando viu que tinha perdido o anel, e que não podia mais dar conta dele; estava à janela quando viu no quintal uma criada a amanhar um peixe. Correu lá, e viu luzir no bucho do peixe o anel; tirou-o, voltou para o palácio. À noite ao serão, o rei tornou a dançar com ela e a repetir as mesmas palavras.
– Dançando to dou, dançando mo hás de dar;
E se mo não deres, a vida te há de custar.
Maria da Silva mostrou-lhe o anel e repetiu as palavras que dissera na véspera.
– Dançando o recebi, dançando o hei de dar;
Também hei de ser rainha e no seu reino reinar.
Então o rei ficou muito admirado, e disse:
– Já que ninguém pode fugir à sua sorte e tens de ser minha mulher e rainha, já gosto de ti, e hoje mesmo se façam as bodas.
Contos Tradicionais Portugueses, Teófilo Braga
Descalça vai para a fonte
Leonor, pela verdura;
vai formosa e não segura.
Leonor, pela verdura;
vai formosa e não segura.
Leva na cabeça o pote,
o testo nas mãos de prata,
cinta de fina escarlata,
sainho de chamalote;
traz a vasquinha de cote,
mais branca que a neve pura;
vai formosa e não segura.
o testo nas mãos de prata,
cinta de fina escarlata,
sainho de chamalote;
traz a vasquinha de cote,
mais branca que a neve pura;
vai formosa e não segura.
Descobre a touca a garganta,
cabelos de ouro o trançado,
fita de cor de encarnado…
tão linda que o mundo espanta!
chove nela graça tanta
que dá graça à formosura;
vai formosa, e não segura.
cabelos de ouro o trançado,
fita de cor de encarnado…
tão linda que o mundo espanta!
chove nela graça tanta
que dá graça à formosura;
vai formosa, e não segura.
Luís de Camões
1524 // 1580 ( século XVI)
POEMA DA AUTO-ESTRADA
Voando vai para a praia
Leonor na estrada preta
Vai na brasa de lambreta.
Leonor na estrada preta
Vai na brasa de lambreta.
Leva calções de pirata,
Vermelho de alizarina
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.
Vermelho de alizarina
modelando a coxa fina
de impaciente nervura.
Como guache lustroso,
amarelo de indantreno
blusinha de terileno
desfraldada na cintura.
Fuge, fuge, Leonoreta.
Vai na brasa de lambreta.
Vai na brasa de lambreta.
Agarrada ao companheiro
na volúpia da escapada
pincha no banco traseiro
em cada volta da estrada.
Grita de medo fingido,
que o receio não é com ela,
mas por amor e cautela
abraça-o pela cintura.
Vai ditosa, e bem segura.
Como rasgão na paisagem
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.
corta a lambreta afiada,
engole as bermas da estrada
e a rumorosa folhagem.
Urrando, estremece a terra,
bramir de rinoceronte,
enfia pelo horizonte
como um punhal que enterra.
Tudo foge à sua volta,
o céu, as nuvens, as casas,
e com os bramidos que solta
lembra um demónio com asas.
Na confusão dos sentidos
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.
já nem percebe, Leonor,
se o que lhe chega aos ouvidos
são ecos de amor perdidos
se os rugidos do motor.
Fuge, fuge, Leonoreta
Vai na brasa de lambreta.
Vai na brasa de lambreta.
António Gedeão
1906 // 1997 ( século XX)
In Máquina de Fogo
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